segunda-feira, 22 de outubro de 2012

XLII - Clichês

Então, agora é a hora dos clichês, não dá pra fugir muito disso quando estamos falando de romance, não é? Vamos lá... é igual a injeção, dói no começo, mas depois você se acostuma e até pensa que pode facilmente passar por isso outra vez:


- Meu Deus do céu, Justine, o que você está fazendo aqui no meio do deserto, sua louca?!
- Persy... eu, vim te ver!
- Você tem noção do que você fez? Você poderia ter se perdido, poderia ter se machucado, poderia ter...
- Mas... não aconteceu, e eu estou aqui! Não completamente inteira, pois estou muito cansada...
 - Oh, Juss... oh... - Ele resmungou, me puxando novamente em sua direção, agora me abraçando com muita força, e então conseguiu juntar algumas palavras – eu não faço idéia de como você chegou até aqui, e nem consigo imaginar qual foi a desculpa que você deu para o Rick, mas... estou muito feliz por te ver.
 E então foi a minha vez de apertá-lo enquanto me explicava:
- Não importa como foi que eu cheguei até aqui, pois se passei por algum momento difícil eu já consegui esquecê-lo, só por estar te abraçando nesse momento.
Ele quase me esmagou tamanha era a força dos seus bracinhos frágeis ao meu redor, bom, talvez não fossem tão frágeis assim como eu imaginara até então:
- Pensar em você no meio do deserto sem ninguém para te proteger foi demais para o meu coração, não consegui, Persy... tenho que proteger você, entende?
Ele me soltou, e me encarou de forma muito séria, nem preciso comentar o quanto ele estava maravilhoso naquele cenário, pois isso já é de se esperar:
- Juss, não é você que tem que me proteger, eu sei me cuidar... não entendo essa sua fissura em relação a mim, não é por que eu nunca... sabe? – Ele fez o gesto de afogar o ganso com a mão e eu quase me mijei de rir, mas só por um instante, pois continuei prestando atenção nele – Que eu não saiba me virar... e modéstia a parte, eu sei fazer isso muito bem. - Eu não concordava, de maneira nenhuma, você não deixa um bebê em casa por horas a fio sozinho, esperando que ele se alimente corretamente, que se mantenha longe das tomadas e coisas perigosas, concordam? - Agora, você não pode sair por ai fazendo esse tipo de loucura, você não deveria ter feito isso de forma alguma, Justine!
Persy parecia estar um pouco bravo agora, estaria eu então estragando a sua viagem com a Kraken traidora? Abaixei a cabeça tentando absorver a sua lição de moral, não era exatamente esse o tipo de reação que eu esperava dele, achei que fossemos nos agarrar e rolar pelas dunas sem medo algum de sermos felizes, não esperei mesmo que ele fosse de repente, chamar a minha atenção:
 - Me desculpe... eu, não queria estragar a sua viagem... – Ele não respondeu, e o único barulho entre nós era o vento e o meu coração, fiquei curiosa afinal, porque diabos ele não continuava com o sermão, e me mandava embora de uma vez? Seria bem menos torturante.


Então levantei a cabeça para encará-lo novamente, ele continuava muito sério, mas lentamente seu rosto foi ficando mais leve, e então ele ergueu um dos lados da boca esboçando o que seria o seu sorriso simpático, talvez? Eu fiz o mesmo por sentir que ele tinha ficado mais maleável, e então ele voltou a falar:
 - Você não está estragando a minha viagem, Juss, você não sabe o quanto estou feliz, e nem pode saber realmente o tamanho da minha felicidade por te ver, por você estar aqui... mas, você não poderia correr tantos perigos assim, por que não me esperou no acampamento? Não deveria ter se enfiado no meio do deserto... você poderia ter se machucado de verdade, existem serpentes por aqui, e são extremamente venenosas, você poderia também ter se perdido, e Deus sabe se algum dia iríamos te encontrar viva... Juss, o deserto não é o que parece ser, ele é traiçoeiro, você não pode, não deve nunca caminhar sozinha, não... não pode, é perigoso demais, entendeu?


- Sim... – respondi chorosa – eu entendi, mas você está aqui... e está sozinho!
- Eu conheço o território, eu consigo ver de onde o perigo vem, sou velho de guerra nesse quesito, você não!
 - Para de brigar comigo, Persy, por favor... – reclamei por fim, já quase chorando de verdade.
- Ah... me desculpa, me desculpa... vem cá... – Ele me puxou de volta para o seu corpo, de alguma forma me senti muito protegida – Só prometa que não vai fazer isso de novo... promete?
- Eu prometo. – Jurei em falso, pois faria tudo de novo, e de novo e de novo.
- Não estou brigando com você porque estou bravo... estou brigando, porque se um dia soubesse que algo de ruim te aconteceu, por você ter vindo atrás de mim, eu não iria me perdoar, porque... – Eu o encarei, e seus olhos estavam nos meus, estavam meio apavorados até o momento, mas antes dele dar continuidade as palavras, eles tornaram-se doces – porque não suportaria perder você.
 - Você não pode então me julgar, por ser irresponsável... pois só fiz tudo isso, porque eu não suportei te perder, ainda que supostamente... ainda que soubesse que você estava vivo e bem, eu quase me joguei pela janela quando soube que Lola tinha vindo com você pra cá! Fiquei louca, Persy... não consigo lidar com essa situação, é demais pra mim! E por falar nela, onde está aquela devoradora de homens?

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

XLI - Surpreendida


Felizmente todas as alternativas foram descartadas, vi então em câmera lenta a figura distante de Persy parar, e girar a cabeça para os lados, aproveitei para dar mais um berro daqueles, antes que ele achasse que estava tendo alucinações:
- Persy!!! Persy!!!


Ele virou-se em minha direção, e finalmente ouvi o meu nome com a sua voz:
- Justine?! – E então ele começou a correr em minha direção, ao mesmo tempo que eu comecei a correr em direção a ele. E nós seguimos chamando um pelo outro por cerca de dois minutos e meio, e vocês devem estar pensando agora:
 “Que coisa exaustiva”
 E eu respondo... realmente foi exaustivo, minha garganta secou horrores, mas eu queria que tudo tivesse um quê de magia e romantismo de filme Hollywoodiano, não me importei então em estar com a garganta seca, pois sabia que quando fosse contar a história algumas semanas após o ocorrido nem iria me lembrar disso.


Então, finalmente estávamos prestes a nos encontrar, e estávamos a poucos metros disso acontecer, Persy parou de correr, eu fiz o mesmo e não sei dizer o porque, acho que apenas reagi a ele. Permaneci parada, e Lars Persy avançou muitos e muitos passos a mais, e sem que eu tivesse notado, fechei os olhos esperando pelo beijo, que veio em seguida... uma frase para descrever o momento? Foi lindo, como era de se esperar... e digo que me surpreendi com a sua forma de beijar, pois posso dizer que ele beija muito, muito bem; Não que em qualquer momento eu tivesse alguma duvida disso, não esperava nada dele que não fosse perfeito, mas imaginei que ele não tivesse experiência o suficiente, nada que com algum tempo de prática não pudesse melhorar, o fato era que ele não precisava melhorar nada, seu beijo estava na medida exata.

domingo, 7 de outubro de 2012

XL - Miragem


Passei muitas horas caminhando, correndo, caminhando, correndo, e não avistava nada que não fosse areia, e mais areia e mais areia, já estava exausta quando pude notar que o anoitecer se aproximava, e eu comecei a ficar preocupada, pois tinha cumprido um puta trajeto, e nada de novo acontecia a minha frente a não ser o sobe e desce das dunas.


E para o meu completo pavor, a noite chegou... e lá estava eu, no meio do nada, no meio do escuro sem saber pra onde ir, pensei em voltar... quem sabe não encontrava uma daquelas barracas vagas?


Por fim, quando já estava realmente desistindo e voltando para a civilização, o deserto se iluminou completamente, as pirâmides, de repente, surgiram em forma de milagre na minha frente, eu quase chorei de emoção... então comecei a caminhar lentamente, curtindo um pouco o alívio de não ter feito todo aquele trajeto em vão.


Quando o deserto está escuro, e então não há sequer um barulho para te atrapalhar, eu soube exatamente como o Persy se sentia, e percebi o porque dele falar sobre o deserto de uma forma tão mágica. Aquele era um momento único, e por mais que eu estivesse cansada - e eu estava podem apostar - tentei curtir aquilo como o Persy curtia, lembrei-me dele falando do céu do deserto, que era simplesmente um céu perfeito, e então eu pude comprovar, ele tinha razão.
 Imaginei Lola, tendo as mesmas sensações que eu, e tive raiva dela novamente, mas não esqueci que deveria mandá-la sã e salva para os braços do Rick, ou então ele poderia ficar muito bravo comigo, e eu não queria que ele ficasse.
Voltei a focar no céu, deixei a raiva de Lola pra outra ocasião, e desejei profundamente que eu encontrasse o Persy, desejei profundamente que o nosso primeiro beijo fosse sob o céu que ele mais admirava, e que consequentemente era o mesmo que eu passei a admirar.


Quando voltei os olhos para a minha frente, eu mal pude acreditar.
 Estava muito escuro, ainda que as fortes luzes das pirâmides pudessem dar alguma noção de espaço, e ainda que parecesse perto, não estava tão perto assim; Lembrei-me das pessoas que tem miragens no deserto, e desejei que eu não fosse uma delas, pois a minha frente - e eu devo admitir muito e muito na minha frente -  pude enxergar a figura de Persy caminhando solitário, estiquei meus olhos para todos os lugares a procura do Kraken, Lola... mas constatei, Persy estava sozinho.
Lola era realmente a vaca mãe de todas as vacas másteres, como ela poderia ter deixado que ele caminhasse sozinho pelo deserto? Deveria ela estar então no acampamento, aquela vacilona! Mas deixei pra lá, não perderia mais meu tempo com Lola, não naquele momento, então deixei que aquele misto de emoção e saudade, e que a ânsia em abraçá-lo tomassem conta de mim, e dei voz as minhas necessidades chamando-o pelo nome:
- Senhor Inglesson! – Vocês tinham dúvidas de que eu o chamaria assim? Fiquei morta de raiva por Youssef chamar o Persy de “senhor Inglesson”, quando eu ainda não o tinha chamado assim; Mas Persy não parou de caminhar, forçando-me a chamá-lo novamente:
- Lars Persy! – Ele não deixou de caminhar, mas que diabos! Não tinha um ruidinho naquele lugar que não fosse o vento, estava tudo tão quieto que eu podia ouvir até a areia se movimentar, como seria possível ele não me ouvir? Acumulei uma boa quantidade de ar, e então berrei freneticamente:
- Persy! Heeei! Persy! – Bom, foi perfeito, devo confessar... e creio que pude ser ouvida em Bridgeport, pois o nome dele ecoou por todo o deserto, e se ele não parasse de caminhar agora, existiriam três alternativas:
I - Estava tendo uma miragem
II – Persy estava irado comigo e iria me deixar dormir no chão.
III – Ele era surdo.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

XXXIX - AL Simhara III


Youssef sorriu simpático para mim:
- Então, onde ele está, hein? Sabe me informar em que hotel ele está hospedado?
Youssef sorriu novamente, agora debochando de mim, pude sentir, e então falou na língua enrolada alguma coisa como:
"Dsauhafafa lapububele Inglesson hahaha ijdaijdsaekekepuuuuf"
E todos que estavam por perto riram também, e é claro que todos, assim como Youssef, estavam debochando de mim.
Aquilo era um péssimo começo, e nada bom para o turismo local, eu mesma seria uma pessoa que iria meter o pau nessa recepção nada calorosa com os turistas:
 - O.k, não entendi a piadinha interna, mas... é caso de vida ou morte, sabe? Eu preciso encontrar ele com urgência, Youssef!


- Bom, Justine... vejo que nunca esteve em Al Simhara. – Mas qual era a dúvida? Eu não estar vestindo uma camiseta de souvenir, ou não falar a língua deles?
- Não, realmente nunca estive, poderia explicar pra você com detalhes tudo sobre mim, mas... agora não tenho tempo!
- Não temos hotéis aqui, e todos os turistas ficam hospedados em suas barracas na base de turismo.
- Ahh, isso faz algum sentido... - Era um local horrível certamente, mas também era o local mais movimentado dali. – O Persy, está lá?
- Persy?
- O senhor Inglesson! Pelo amor de Deus!
- Ah sim... bom, o Senhor Inglesson saiu com a comitiva há cerca de duas horas em direção a pirâmide de Gizé.
- E quando sai a próxima comitiva? – Indaguei já puxando meu porta moedinhas, para contar as merrecas.
- Daqui cinco dias.
- Como?
- Cinco dias, senhora Justine.

Não, não, aquilo não poderia estar acontecendo, não comigo! Não poderia ficar ali, durante cinco dias plantada esperando que o Persy aparecesse miraculosamente. De repente, eu me lembrei das histórias que ele contava, e do tempo considerável que ele passava enfiado nas tumbas, aquilo estava começando a se parecer muito com um pesadelo, então com a voz chorosa eu reclamei:
- Mas, que merda... vim de tão longe, estou sem dormir há um tempão, não sei nada da cultura local, e... que merda! Naquela altura eu já estava fungando.
- Deixa eu ver se posso fazer algo pela senhora, já comprou a comida seca?
- Não, aonde vende?
- Aquela mulher – ele apontou pra mulher do bolinho de barro – Ela vende comida seca.
- Ela tava tentando me vender uns bolinhos de barro, mas... eu não tenho interesse em andar por ai com bolinho de barro.
- Não são bolinhos de barro! É a comida seca, senhora Justine!
Aquilo viscoso, é de comer? Urghh eu nunca, nunca conseguiria colocar aquilo na boca, preferia passar fome, mas, de qualquer maneira, acabei comprando por medo do Youssef não me ajudar, porque afinal eles deveriam viver de turismo imaginei.


Ele ainda quis que eu comprasse um saco de dormir ou uma barraca, mas eu expliquei a ele que não poderia seguir pelo deserto com todo esse peso em mãos, e ele acabou concordando, ainda que tenha me alertado que seria impossível eu conseguir dormir sem um dos dois, mas pensei comigo, se eu tivesse sorte e Lola ainda não tivesse convencido o Persy a não ser mais gay, quem sabe ele me daria uma pontinha do seu saco de dormir? Iria então depositar minhas esperanças nesse pensamento.
Por fim, depois de toda a ajuda do Youssef, finalmente segui em direção a pirâmide, e o ouvi dizer ao longe:

- Não tem como errar, Senhora Justine! Ele seguiu para a pirâmide maior, a maior não se esqueça!